25/03/2015 às 10h14 - Atualizado em 25/03/2015 às 10h14

Encontro Regional do Congemas Sudeste discutiu implementação do SUAS na prática cotidiana da gestão pública

Por Monica Dias*

A mesa de abertura foi composta pelo prefeito de Niterói, o secretário municipal de assistência social, o presidente do Congemas, a ministra do desenvolvimento social, a secretária estadual do desenvolvimento social, a secretária nacional do desenvolvimento social e o representante do conselho nacional da assistência social, entre outros. Os palestrantes falaram de suas trajetórias na assistência social, dando ênfase ao percurso de luta para a consolidação do paradigma da garantia de direitos e à superação das práticas de trabalho assistencialistas, presentes ainda em algumas áreas.

O prefeito de Niterói ressaltou os desafios do trabalho com a população de rua e os projetos que a cidade tem realizado com esse foco. O presidente do Congemas refletiu sobre a importância do ano de 2015, que consolida 10 anos de criação do SUAS, e aponta a necessidade de realizarmos um balanço sobre o que conquistamos e o que pretendemos realizar nos próximos dez anos. O secretário municipal de assistência social, chamou a atenção para a importância dos municípios ajustarem as suas legislações ao SUAS e pontuou a importância dos governos estaduais e do pacto federativo para a consolidação do SUAS. Ressaltou que, além do exercício técnico, é necessário também um exercício político, sobretudo porque existem no congresso nacional alguns projetos de lei que podem trazer um retrocesso para a consolidação do SUAS.

A fala da ministra do desenvolvimento social foi a que teve maior espaço na mesa. A ministra falou da importância da militância da agenda social para fazer a política do SUAS avançar e da necessidade de se construir parcerias em várias instâncias. Disse que os 10 primeiros anos do SUAS foram para colocar a agenda social na pauta política, agora, os próximos dez anos são para dar visibilidade ao que fazemos no SUAS, para mostrar como o trabalho no SUAS, efetivamente, impacta a vida das pessoas. A ministra falou que somente 17 municipios do Brasil ainda não têm um CRAS e que, nesse sentido, a política avançou muito, porque hoje cobre, praticamente, todo o território nacional. Depois, passou a falar do co-financiamento e dos recursos do SUAS que estão parados, aguardando a liberação ou aguardando a implantação de projetos. Ressaltou a importância dos municípios apresentarem seus indicadores, porque o dinheiro é liberado, mais rapidamente, para aqueles que mostram o que fazem e como aplicam seus recursos. A prioridade é para quem está realizando. Outro ponto abordado pela ministra foi a qualificação dos profissionais do SUAS. Ela apontou os avanços obtidos nesse aspecto, mas, ressaltou a necessidade de avançarmos ainda mais, para garantir a qualificação a todos os profissionais da rede SUAS. Apresentou, também, números sobre a expansão do BPC, ressaltando que, agora, é importante ampliar os serviços e não só número de beneficiários. Falou da importância da cobertura dos CRAS e CREAS em todo território nacional, porque a assistência social é também uma porta de entrada para outras políticas, como a saúde, por exemplo. A ministra disse que o grande desafio da assistência social agora é de gestão, é para qualificar o atendimento à população, construindo indicadores para medir o quanto se avançou e o que precisa ser feito para se chegar aonde queremos. Ainda não temos um padrão nesse atendimento, existem municípios que trabalham de acordo com a proposta do SUAS e outros que continuam com práticas assistencialistas. É preciso construir indicadores de serviços do SUAS e ampliar a discussão do que cabe a cada ente do pacto federativo. O sistema tem que ser de parcerias. É preciso, também, ampliar a interlocução com a sociedade, pois, hoje, ainda existe uma parcela da população que não sabe o que é o SUAS e nem pra que ele serve. Existe ainda um preconceito da sociedade em relação ao trabalho com populações que estão em situação de vulnerabilidade social. A ministra pontuou que esse preconceito se estende, também, aos profissionais que trabalham com essas populações, por isso, precisamos melhorar a interlocução com a sociedade, para mudarmos essa visão.

A segunda mesa do Congemas foi intitulada: painel temático: a implementação do SUAS na prática cotidiana. Teve como palestrantes a secretária nacional de assistência social, a secretária adjunta do governo do estado de Minas Gerais, o secretário de assistência social do município de Niterói e o presidente do Congemas, a coordenação da mesa ficou com a representante do Congemas São Paulo.

A secretária nacional de assistência social foi a primeira a falar. Ressaltou a importância da construção conjunta e coletiva do SUAS, pontuou como a capacidade de organização e superação se constrói a partir da atenção às especificidades e demandas de cada região. Mas, ressaltou que ainda há uma grande dificuldade, no conjunto dos entes federados, para padronizar os serviços oferecidos. A secretária falou sobre o papel da assistência social no sistema de proteção, dadas as diversidades existentes nas várias regiões, que envolvem até mesmo diferenças nas regiões de um único estado. Apontou como papel fundamental da assistência social garantir proteção e monitorar as situações de vulnerabilidade e risco para oferecer serviços específicos com equipes capacitadas e com co-financiamento. Ressaltou que a cultura política e o legado histórico mesclam dois projetos opostos, um de intervenção assistencialista e outro de direito e proteção social, no qual estado e sociedade civil complementam o atendimento. Antes os trabalhos eram segmentados, não eram continuados e os trabalhadores não eram profissionais, mas voluntários. Há uma continua disputa entre as idéias assistencialistas e a noção dos direitos sociais. A vulnerabilidade não é culpa do indivíduo, mas de condições sociais. Na discussão da vulnerabilidade, é importante ver a partir do individual algo que é coletivizado. O SUAS tem como princípios éticos dignidade, liberdade, respeito às opções, atenção as questões de gênero, raça, crença, idade. A assistência social disputa espaço e verbas com outras políticas, por isso é necessário superar preconceitos, demonstrando o impacto desses serviços e a importância dos profissionais dessa área. Se isso não for feito, não conseguiremos mudar os preconceitos da sociedade em relação à assistência social. O SUAS tem como princípios organizativos: universalidade, gratuidade, integralidade da proteção social, intersetorialidade, equidade. É importante construir um plano decenal para planejar os próximos dez anos. A política tem que estar em todos os lugares. Só faltam um município no sul e outro no sudeste para que todos os municípios brasileiros tenham um CRAS. É necessário discutir as diferenças regionais, não é possível ter uma regra única para todas as capitais, porque cada uma tem uma característica. É preciso fazer uma discussão: quantos profissionais, quantas famílias. É preciso discutir, também, a relação do Estado com as Ongs. O custo dos serviços em cada ente federado é outro ponto importante a ser levantado. Assim como a integralidade na proteção, porque ainda há disputa se a pessoa vai ser atendida pelo CRAS, CREAS ou POP. Fazer um atendimento com plano de atenção discutido por todos os profissionais. Não se garante a proteção social sem a intersetorialidade, não é a assistência social que vai dar conta de tudo, tem que ser discutido com outras áreas. Nas diretrizes estruturantes do SUAS, é fundamental discutir as responsabilidades, comuns e exclusivas, da união, dos estados e dos municípios. Nas categorias que orientam a implementação do SUAS, é importante discutir a regulação e a legislação ( federal, estadual e municipal); a demanda e o acesso (diagnóstico e cobertura relacionados a cada tipo de vulnerabilidade e violação de direitos); a integração entre serviços e benefícios; a composição da rede (ofertas público-estatais e públicas não estatais); a qualificação dessas ofertas; a estruturação e o funcionamento dos conselhos e participação dos usuários. Como agenda para o futuro, a secretária apontou a consolidação do reordenamento dos serviços nas instituições de acolhimento, a relação com o sistema de justiça (restaurativa, comunitária, mediação de conflitos), o fortalecimento da intersetorialidade com o sistema justiça, a educação e a saúde. Por fim, a necessidade de ampliar a discussão de agendas com os municípios e estados.

A segunda palestrante, do painel a implementação do SUAS na prática cotidiana, foi a secretária adjunta do governo do estado de Minas Gerais, que iniciou sua exposição falando sobre a importância de discutirmos o cotidiano do SUAS. Disse que esse é um debate que está posto, mas, não está sistematizado. É necessário mudar a maneira como o SUAS vem se apresentando, vem se colocando na agenda política. No cotidiano é fundamental transformar o que vem a partir das demandas dos municípios, mais do que o que vem na norma na política pública. Boa parte das dificuldades vivenciadas tem relação com o cotidiano, com a entrega dos serviços nos municípios. 1 bilhão e 500 milhões de reais parados no fundo SUAS? Como ajudamos os municípios a acessarem esse dinheiro? Ainda não conseguimos resolver esse problema. Fizemos capacitações, falamos com o TCU, mas, não resolvemos isso. Foi importante darmos escala ao SUAS, hoje temos CRAS em todos os municípios, mas, o serviço não está universalizado, precisamos de financiamentos para cobrir todas as áreas vulneráveis. Dar escala ao SUAS foi o que nos inscreveu na agenda política, mas, agora temos que falar da qualidade do trabalho que fazemos. Na articulação com a rede privada tivemos várias fases: o auge das instituições, o auge dos gestores, agora é o auge dos trabalhadores da rede privada do SUAS, isso faz parte do SUAS. O que foi feito com o cadastro nacional? Qual é a qualidade do serviço prestado? O Capacita SUAS é o maior programa de capacitação, mas, como ele é voltado para o cotidiano? Esses debates têm que ser trazidos para os programas do Capacita Suas. A omissão dos Estados contribui muito para as dificuldades dos municípios. O estado repassa ou não o dinheiro para os municípios. Os municípios têm baixa capacidade institucional, porque os estados não fazem a assessoria aos municípios. Tem que acompanhar e capacitar. Não assessoram e não acompanham. É importante criar equipes de assessoramento e de acompanhamento para os municípios. É preciso olhar os problemas cotidianos, mas de uma forma mais propositiva. O que fazer para resolver? Fazer uma adequação do Capacita Suas para ensinar como usar o dinheiro, como ler o orçamento. Fazer reuniões com o tribunal de justiça e com o ministério público para discutir os TACs. Conversar antes de ajuizar uma ação. A ação tem que ser contra o SUAS (união, estado e município) e não contra o município. São muitos TACs propostos pelo MP. Os municípios viram reféns do ministério público. Assinam os TACs e depois? Quais são as estratégias para resolver os problemas? O tribunal de contas tem que pedir para os contadores mudarem a forma de fazer a contabilidade. Discutir mais a participação dos estados. Quais serão as deliberações para os estados e como isso será cobrado? Como o MDS vai fazer para os estados cumprirem o combinado no Congemas? Quais serão os incentivos e as sanções que os estados terão?

Após a fala da secretária adjunta do estado de Minas Gerais, deu-se inicio a fala do terceiro palestrante da mesa, o presidente do Congemas. O palestrante iniciou chamando a atenção para a comemoração dos dez anos do SUAS, a ser realizada no meio deste ano. Depois, disse que o papel dos estados, nesse momento, é fundamental e estratégico na consolidação do SUAS. Não podemos abrir mão disso e precisamos fazer planejamentos alinhados. Há necessidade de fortalecer o diálogo com o parlamento e com outros atores do sistema como advogados e contadores, porque sem eles o SUAS também não avança. Temos que trazer para o diálogo com o SUAS os parlamentares de todos os níveis: federal, estadual e municipal. Junto com o MDS, estamos dialogando com o CNJ e com o CNMP para melhorar a atuação e a relação no cotidiano. Precisamos facilitar a fala para os nossos interlocutores. Se formos perguntar aos usuários o que é o SUAS, eles não vão saber explicar. É preciso melhorar o diálogo com a sociedade, explicando o SUAS e seu funcionamento. O palestrante disse que no Espirito Santo já estão sendo feitas assembléias públicas com o Legislativo para explicar o SUAS e seu funcionamento. É preciso olhar a legislação e fazer com que ela se torne uma realidade. Os secretários municipais estão sendo processado depois que saem dos seus cargos, porque não atentaram bem para a legislação. Os órgãos de controle social estão processando os secretários. É preciso avançar no processo de consolidação do SUAS com segurança jurídica. Não pode ser confraria. O SUAS não é para distribuir cestas básicas, é para dar um atendimento, é preciso estar atento aos critérios estabelecidos na legislação. O município deve fazer também a sua legislação própria. Quando falamos de orçamento também precisamos evoluir. Temos deficiência em planejamento, organização, processos e orçamentos. Temos que aprender a planejar melhor, entender as demandas dos municípios e orçar isso. Quantos estados brasileiros estão investindo na PNAS? Está na pauta de discussão a regionalização. O estado tem um papel importante nisso. A proteção social básica está melhor do que a proteção social especial. A população que está lá precisa ser assistida. É necessário regular a assistência social. Quando a demanda aparece, para onde vai, quem atende? É preciso organizar o território. Cada estado tem as suas características. A judicialização é também uma discussão que precisa ser trazida para um patamar de maior igualdade. Gestores e Juizes não têm um diálogo igualitário. Que instância vai ser utilizada para dialogar com esses entes? Qualidade de gestão também é uma parte importante. Não basta ter dinheiro, é preciso manter a qualidade dos serviços, apresentar resultados no Capacita Suas e em outros relatórios. Os municípios executam os serviços e o orçamento dos estados sai daí. É preciso um pacto de aprimoramento dos estados. O orçamento cai se o funcionamento dos serviços não está de acordo com o que a legislação manda.

O quarto, e último palestrante desse painel, foi o secretário municipal de Niterói. O palestrante disse que é necessário discutir os rumos do SUAS no Brasil, mas, aqui no Sudeste, desde a LOAS até agora já temos um bom percurso e traçamos um plano de vôo consistente. O sudeste tem como característica mudar o rumo da política, tem um papel muito importante na consolidação dessa política. Um pacto federativo para o SUAS é um aspecto fundamental para a consolidação da política. Se o MDS não tivesse assumido o papel de fazer a política pública acontecer, conversando diretamente com todos os municípios, o SUAS hoje não existiria. A ligação direita entre governo federal e municípios foi fundamental para a implantação do SUAS, mas, o papel do estado é importante. Se o governo do estado não ocupar o seu papel, não só de co-financiamento, mas de trabalho conjunto com os municípios, se não compreender a importância do fortalecimento do SUAS, não vamos avançar. É o município que fica lá levando toda a carga do MP e dos usuários e, sem o apoio do estado, os entraves não vão se resolver. Por exemplo, o Conselho Tutelar, quando tem um problema, ao invés de falar com a SMAS, aciona direto o ministério público. O debate do aprimoramento do SUAS precisa passar pelos pactos federativos. A regionalização é um processo complexo, 70% dos municípios são de pequeno porte. É preciso fazer a regionalização física, gestões administrativas para cada município, apoiando aqueles que estão perto. Temos ainda uma cultura muito clientelista e isso afeta a implantação de uma cultura de garantia de direitos. Por que algumas políticas públicas não acontecem? Porque nós temos projetos de assistência em disputa. Romper com a cultura assistencialista para implantar a garantia de direitos ainda é muito difícil. O trabalho social com família é primordial para isso. Qual o papel que esse trabalho tem tido? A emancipação tem que estar presente nesse debate. O desafio da responsabilidade social e da responsabilidade fiscal. As cotas de concurso público são baixas. Há um impacto no orçamento e temos um teto de 60%. A maior ferramenta para ocupar espaço são os próprios trabalhadores da assistência. A formação continuada é fundamental. Niterói ainda não conseguiu fazer um concurso para os trabalhadores da assistência social.

 

*Comissão ampliada – região Sudeste